Jean-Paul Prates - 30/8/2007
O pavor, compreensível, do empresariado brasileiro em relação a qualquer ameaça de intervencionismo estatal é altamente louvável e demonstra maturidade. Talvez isso explique a reação estriônica das últimas semanas em relação aos sinais dados pelo governo no sentido de querer regular o setor alcooleiro.
Na semana passada, em Brasília, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, discutiu com dirigentes da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) um projeto de lei pelo qual a ANP passará a ser responsável pela regulação e autorização das atividades de produção, estocagem, distribuição, revenda, comercialização, importação e exportação de álcool.
A entidade, que representa os interesses das indústrias privadas de álcool e açúcar, reagiu com veemência em contrário. O documento preliminar por ela emitido, denominado “Sumário Executivo - Projeto de Lei para Regulação do Mercado de Etanol”, procura demonstrar a inviabilidade da idéia: alega que o novo marco regulatório insere a cadeia produtiva da cana na Lei do Petróleo, o que seria ilegal. Segundo a Única, as atividades canavieira e petroleira seriam "incompatíveis". Argumentando que o setor sucroalcooleiro compõe-se de mais de 400 empresas regidas pelo princípio da livre concorrência e não pelo monopólio, a entidade entende que o segmento dispensa regulação econômica intervencionista - pois "o mercado é quem desempenha o papel da auto-regulação". Além disso, a Lei do Petróleo teria sido criada para tratar das atividades definidas como monopólios da União, nas quais o álcool não se enquadra, o que tornaria o projeto até mesmo inconstitucional. No limite, alguns comentários posteriores chegaram a assustar o mercado com rumores de que o Governo estaria procurando viabilizar uma "alcoolbrás" tentando monopolizar as exportações.
Não é bem assim. O governo tem razão em preocupar-se com algum grau de regulamentação neste segmento, pois há muito o álcool deixou de ser uma mera "commodity agrícola", passando a ser um combustível que, por suas características físicas e econômicas, requer sim um tratamento diferenciado. Além disso, sucessivos governos vivem incomodados com as altas freqüentes no preço do álcool nas usinas e nos postos de gasolina a cada início de ano ou pedidos compensatórios quando a produção de açúcar é mais (ou menos) compensatória. Por isso, torna-se um aspecto importante da política energética e setorial do País o controle sobre a cadeia de produção, comercialização e exportação do produto.
A proposta governamental não fala em dar monopólio à Petrobras, e nem em controlar preços. Apenas pretende, acertadamente, dar ao etanol o tratamento legal de um combustível - e não apenas de um produto agrícola - e aumentar a fiscalização da Agência Nacional do Petróleo (ANP) sobre a cadeia produtiva e comercial deste segmento. A idéia é aperfeiçoar a regulamentação do setor para garantir tanto o abastecimento do mercado interno quanto as exportações.
Um dos aspectos discutidos foi a situação de impasse jurídico existente com relação à expansão da malha nacional de dutos para transporte de gás natural. Na visão dos produtores de álcool, essa insegurança simplesmente contaminaria o segmento de transporte dos biocombustíveis, caso sejam equiparados ao gás, petróleo e derivados. Ora, esta é a pior das argumentações: um erro não justifica o outro. O que se tem que fazer é corrigir a situação no gás e estender o livre acesso (regulado e igualitário) a todos os sistemas em rede (dutos) que constituem monopólios naturais.
Muita água vai rolar por debaixo desta ponte, Os dois lados têm argumentos consistentes, e razões fortes para defendê-los. Mas, neste tipo de debate, o pior enfoque é o do maniqueísmo. Há meio-termos consensuais possíveis - em prol do consumidor e do Brasil. (O Globo)
O pavor, compreensível, do empresariado brasileiro em relação a qualquer ameaça de intervencionismo estatal é altamente louvável e demonstra maturidade. Talvez isso explique a reação estriônica das últimas semanas em relação aos sinais dados pelo governo no sentido de querer regular o setor alcooleiro.
Na semana passada, em Brasília, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, discutiu com dirigentes da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) um projeto de lei pelo qual a ANP passará a ser responsável pela regulação e autorização das atividades de produção, estocagem, distribuição, revenda, comercialização, importação e exportação de álcool.
A entidade, que representa os interesses das indústrias privadas de álcool e açúcar, reagiu com veemência em contrário. O documento preliminar por ela emitido, denominado “Sumário Executivo - Projeto de Lei para Regulação do Mercado de Etanol”, procura demonstrar a inviabilidade da idéia: alega que o novo marco regulatório insere a cadeia produtiva da cana na Lei do Petróleo, o que seria ilegal. Segundo a Única, as atividades canavieira e petroleira seriam "incompatíveis". Argumentando que o setor sucroalcooleiro compõe-se de mais de 400 empresas regidas pelo princípio da livre concorrência e não pelo monopólio, a entidade entende que o segmento dispensa regulação econômica intervencionista - pois "o mercado é quem desempenha o papel da auto-regulação". Além disso, a Lei do Petróleo teria sido criada para tratar das atividades definidas como monopólios da União, nas quais o álcool não se enquadra, o que tornaria o projeto até mesmo inconstitucional. No limite, alguns comentários posteriores chegaram a assustar o mercado com rumores de que o Governo estaria procurando viabilizar uma "alcoolbrás" tentando monopolizar as exportações.
Não é bem assim. O governo tem razão em preocupar-se com algum grau de regulamentação neste segmento, pois há muito o álcool deixou de ser uma mera "commodity agrícola", passando a ser um combustível que, por suas características físicas e econômicas, requer sim um tratamento diferenciado. Além disso, sucessivos governos vivem incomodados com as altas freqüentes no preço do álcool nas usinas e nos postos de gasolina a cada início de ano ou pedidos compensatórios quando a produção de açúcar é mais (ou menos) compensatória. Por isso, torna-se um aspecto importante da política energética e setorial do País o controle sobre a cadeia de produção, comercialização e exportação do produto.
A proposta governamental não fala em dar monopólio à Petrobras, e nem em controlar preços. Apenas pretende, acertadamente, dar ao etanol o tratamento legal de um combustível - e não apenas de um produto agrícola - e aumentar a fiscalização da Agência Nacional do Petróleo (ANP) sobre a cadeia produtiva e comercial deste segmento. A idéia é aperfeiçoar a regulamentação do setor para garantir tanto o abastecimento do mercado interno quanto as exportações.
Um dos aspectos discutidos foi a situação de impasse jurídico existente com relação à expansão da malha nacional de dutos para transporte de gás natural. Na visão dos produtores de álcool, essa insegurança simplesmente contaminaria o segmento de transporte dos biocombustíveis, caso sejam equiparados ao gás, petróleo e derivados. Ora, esta é a pior das argumentações: um erro não justifica o outro. O que se tem que fazer é corrigir a situação no gás e estender o livre acesso (regulado e igualitário) a todos os sistemas em rede (dutos) que constituem monopólios naturais.
Muita água vai rolar por debaixo desta ponte, Os dois lados têm argumentos consistentes, e razões fortes para defendê-los. Mas, neste tipo de debate, o pior enfoque é o do maniqueísmo. Há meio-termos consensuais possíveis - em prol do consumidor e do Brasil. (O Globo)
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