O Brasil descobriu enormes reservas de petróleo na Bacia de Santos. E agora, quem vai explorar as que ainda certamente estão surgindo? Esse é o tema em debate, com a Petrobras reivindicando maior poder e novas regras para novas concessões.
Nada de entregar todo o petróleo às empresas estrangeiras que vierem a descobri-lo, mas, sim, mantê-lo em posse do governo, sob a forma de partilha. A empresa descobridora poderá explorá-lo, mas recebendo parte dele de acordo com contratos pré-assinados, uma vez deduzidos tributos e encargos.
Essa é uma reivindicação justa, pois os investimentos e pesquisas iniciais foram feitos pela Petrobras, na qual o governo é o maior acionista. As que vierem vão aproveitar-se desse trabalho pioneiro e vitorioso, de elevado nível profissional hoje reconhecido no mundo.
MUDAR A LEI?
Mas isso exige uma reformulação da Lei do Petróleo, de Fernando Henrique Cardoso, que, mesmo mantendo "de fato" o monopólio estatal exercido pela Petrobras, abriu espaço para a participação de empresas estrangeiras. Para José Sergio Gabrielli, presidente da estatal, essa lei servia antes da descoberta da Bacia de Santos. Agora, não mais.
É PRECISO CUIDADO
Não se trata apenas de uma discordância técnica, mas da definição de uma nova política petrolífera, com tintas ideológicas. É preciso equilíbrio e cuidado, avaliando os riscos e benefícios. Sem dúvida alguma, o cenário petrolífero mundial mudou profundamente nos últimos dez anos e a Petrobras. Hoje, as estatais dominam a produção e as reservas mundiais de petróleo. E entre estas, se encontra a Petrobras. As grandes empresas privadas perderam espaço. Seria justo, portanto, fortalecer ainda mais a Petrobras, seguindo a política adotada pelos países da Opep, principalmente do Oriente Médio?
Esse é um assunto delicado. Vejamos. (1) Temos agora grandes reservas que podem nos colocar no mesmo nível dos principais membros da Opep, permitindo-nos também ditar as regras para novos investimentos. Mas, ao contrário deles, somos grandes consumidores e importadores ainda. (2) Eles têm recursos infindáveis, trilhões de dólares, campos rasos e maduros e dispensam o capital estrangeiro. Isso não acontece no Brasil, onde os campos são novos, em áreas difíceis que exigem somas imensas das quais só podemos dispor em parte. Nem se sabe quanto esse petróleo custará e se será economicamente viável. Diante disso, a idéia do contrato de partilha, defendida por Gabrielli, é correta, mas é delicada. Ela pode afastar investidores que tanto vamos precisar. Pode argumentar que não temos pressa. Errado. Temos sim, pois a Petrobras importa petróleo leve ao preço do mercado internacional - altíssimo - e importa o pesado, desvalorizado como o da Venezuela. A cada dia perde recursos preciosos que poderia estar investindo no novo campo ou na construção de refinarias que processasse o óleo que temos hoje. Daí a necessidade de atrair investimentos externos para o setor.
QUE TIPO DE CONTRATO?
O ideal seria ter, não nas áreas já descobertas, mas nas novas, uma participação expressiva das empresas de petróleo estrangeiras, liberando recursos e técnicos da Petrobras para as outras áreas promissoras. É preciso uma associação justa do capital nacional e estrangeiro na descoberta e exploração de novas jazidas. Técnicos do mundo todo apontam, surpresos, para o Brasil como uma das maiores promessas no cenário petrolífero mundial. Podemos em alguns anos estar produzindo mais de 3 milhões de barris por dia, superando até alguns produtores da Opep. Mas, para isso, é preciso que o governo se conscientize que o mercado mundial do petróleo mudou e não é mais dominado pelas multinacionais. Vamos precisar do capital externo, sem ferir os interesses nacionais.
SEM PAIXÃO, SENHORES
O mais importante é afastar o risco do retorno às ideologias de esquerda do passado, dos nacionalismos vazios e idiotas, com o do "O petróleo é nosso", um slogan de mais de 50 anos que inspirou um monopólio nocivo ao País. Se tivéssemos aberto há mais tempo o mercado nacional do petróleo e aprovado a Lei do Petróleo, teríamos atraído preciosos recursos que perdemos há pelos menos 20 anos.
Assim, não seríamos hoje tão dependentes do petróleo importado, que sufoca a nossa autonomia energética. Muito do que conseguimos com os preços elevados das commodities agrícolas, que exportamos, está sendo absorvido pela importação de petróleo leve que só agora descobrimos.
MAIS ESTATAL, NÃO!
A solução parece residir na associação de contratos de concessão e de partilha. Mas parece já haver preferência, em Brasília, pelo contrato de partilha, em que o governo mantém a propriedade da reserva e controle da produção. O problema é que esse tipo de contrato talvez não interesse ao investidor externo e já se fala até na criação de uma nova estatal.
Mais uma estatal, não! Absolutamente, não! O presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, muito sagaz, com ar de ingênuo, correu a declarar que é contra. "Uma nova estatal não é bom para o Brasil." Então, quem controlaria esses contratos? Ora, ora, pois não temos a Petrobras? (Fonte: Estadão, 2008-06-05).
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