domingo, 19 de setembro de 2010

Oferta da Petrobras desperta interesse, mas especialistas pedem cautela


O gigantismo da operação de aumento de capital da Petrobras desperta, de forma inegável, o interesse de qualquer cidadão. Ainda mais quando vêm à memória os ganhos acima da média do mercado que os investidores tiveram durante o processo de reforço de caixa feito pela empresa, em 2000, e pela Vale, em 2002. E isso não é por acaso. Os fundos de ações ligados à estatal de energia e os Fundos Mútuos de Privatização (FMP) administrados pela Caixa, por exemplo, tiveram uma valorização de 863% a 910% nesses 10 anos, enquanto o rendimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) ficou em 65,63% no mesmo período, conforme dados da CEF.

Enquanto a procura por ações da Petrobras naquela ocasião ficou abaixo das expectativas, a grande valorização dos papéis logo depois acabou provocando uma corrida pelos títulos da Vale. Naquelas operações, os trabalhadores puderam investir até 50% do saldo na conta do FGTS na compra das ações das empresas. Agora, com a nova oferta de papéis da Petrobras, o limite é de 30% e só poderá usar o FGTS nessa compra quem ainda mantém cotas no FMP da Petrobras criados em 2000.

O superintendente nacional do FGTS, José Maria Leão, lembra que compraram cotas do FMP-Petrobras 312 mil trabalhadores com recursos do Fundo de Garantia. Desse total, restam hoje cerca de 90 mil cotistas, mas esse número será confirmado apenas após o processo de capitalização da estatal.

“Nossa expectativa com essa operação é que ela movimente cerca de R$ 900 milhões nas contas do Fundo de Garantia”, diz ele, evitando fazer comparações entre o FGTS, que tem uma taxa de correção de TR mais 3% ao ano e os fundos.

“O FGTS não é investimento. É um mecanismo para garantir a segurança do trabalhador e, ao mesmo tempo, permitir financiamentos acessíveis ao trabalhador, como o da casa própria”, disse.

Vale lembrar que o momento agora é outro e que todo investimento no mercado de ações implica em um risco bem maior do que uma aplicação na poupança ou fundos de renda fixa. Aplicar os recursos do FGTS é uma das opções mais sugeridas pelos especialistas para a compra das ações da Petrobras.


Recomendações

Alguns dizem que não irão recomendar a compra de ações da estatal devido a dúvidas em torno do futuro da companhia. “A operação irá compensar mais para quem tiver fundo de investimento atrelado às ações da Petrobras. Nesse caso, será vantajoso para o investidor. Agora, eu não recomendo que o investidor desembolse dinheiro vivo para participar da capitalização”, diz uma fonte do mercado.

No próximo dia 29, a Petrobras pretende fazer uma oferta pública de ações no valor de R$ 110 bilhões para reforçar seu caixa e possibilitar a realização dos investimentos programados. Caso a procura supere as expectativas iniciais, esse montante pode chegar a R$ 127 bilhões com a inclusão de lotes suplementares e adicionais.

Quem é cotista do FMP da Petrobras deve formalizar o pedido de aplicação junto à administradora do fundo onde mantém o investimento apresentando apenas os documentos e o extrato do FGTS. O valor solicitado ficará indisponível na conta vinculada até o repasse do valor ao FMP, que deverá ocorrer no dia 29. Uma vez feita a reserva, não há possibilidade de desistência e o trabalhador também não poderá realizar saques na conta vinculada durante o período da oferta. Após a compra, o prazo mínimo para transferência do fundo ou para saque é de um ano, respeitando as regras de retirada do FGTS.

Já os cotistas dos fundos de ações da Petrobras poderão fazer a adesão junto às administradoras de suas respectivas carteiras até o dia 22 de setembro. O mínimo para aplicação é de R$ 200. No dia 23, será feito o fechamento das adesões e divulgado o preço inicial das ações que serão negociadas na oferta pública. No dia seguinte, será iniciada a negociação dos papéis da companhia na Bolsa de Nova York. Na BMF&Bovespa, essa transação será feita a partir do dia 27, sendo que a data fixada para a compra de fato das ações será no dia 29. Caso a demanda supere as expectativas, haverá um lote suplementar que será ofertado a partir do dia 25 de outubro.


Risco derruba ações

Desde o anúncio da nova capitalização da Petrobras, feito no fim do ano passado, as ações da companhia vêm registrando queda e vários investidores internacionais, entre eles o megainvestidor americano George Soros, acabaram vendendo participações. A forte oscilação dos papéis ao longo do ano levantam dúvidas quanto ao tamanho do risco que esse aumento de capital poderá oferecer, especialmente devido ao fato de o governo federal estar ampliando sua participação comprando papéis e pagando com barris do pré-sal ainda não explorados.

Alguns corretores preferem não aconselhar uma aposta nessa capitalização e afirmam que é um mau negócio para os acionistas minoritários, uma vez que o endividamento da Petrobras vem crescendo e a disponibilidade de recursos em caixa está em queda drástica nos últimos meses — apesar do lucro de R$ 16 milhões no primeiro semestre —, podendo comprometer o plano de investimentos de US$ 224 bilhões até 2014.

“Pelo contrato da cessão onerosa, o governo está comprado ações com dinheiro virtual, o que na prática, é um calote”, afirma uma fonte do setor. Ele alerta para o fato de o risco geológico da exploração do petróleo da camada pré-sal ser muito alto e cita a BP como exemplo, ressaltando que os riscos envolvidos em uma tecnologia ainda a ser desenvolvida para perfuração de camadas muito mais profundas são grandes. “Há mais riscos do que certezas”, diz.

Alguns corretores, no entanto, recomendam o investimento. Quem pode apostar com reservas dos fundos ligados ao FGTS leva vantagem, avisam, pois o rendimento nesse caso será bem maior. O FGTS rende, no máximo, 5% ao ano, mas tem garantias e ausência de risco. As ações estão em queda desde janeiro e chegaram a acumular perdas próximas a R$ 80 bilhões, o que fez com que a estatal fosse ultrapassada pela Vale em valor de mercado. Hoje, as ações da mineradora custam quase o dobro dos papéis da Petrobras (R$ 42 contra R$ 26) enquanto há algum tempo era o inverso.


Compra com barris

O presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, durante teleconferência na semana passada, disse que existem garantias no contrato de que mesmo se não houver petróleo na camada pré-sal a União arcará com os custos comprometidos. Pelo contrato, o Estado cedeu 5 bilhões de barris de várias áreas do pré-sal à Petrobras em troca de ações da empresa. “Os volumes estão garantidos para o contrato da cessão onerosa, de R$ 74,8 bilhões, considerando a taxa de câmbio média de agosto. Os contratos serão revisados durante a perfuração e outras áreas poderão ser incluídas caso o total de barris não seja alcançado.”

(Fonte: Correio Braziliense: Rosana Hessel, 2010-09-12).

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